segunda-feira, 26 de março de 2012

Balanço


Estou balançando. Empurrando meu corpo para trás e para frente,
escutando o ranger das correntes enferrujadas. O parquinho está vazio.
Somente eu e os deprimentes brinquedos velhos. Um lugar para crianças não
devia parecer tão sem vida, nunca.
Bem, ele não era.
Estou cansada. Cansada de forçar-me para frente e depois para trás, para
tentar ir mais alto. Então apenas paro e deixo-me balançar pelos meus
esforços passados. Não penso em nada. Só ouço o barulho das correntes,
para trás e para frente...
De repente algo empurra minhas costas para frente e abro meus olhos,
alarmada.
- Vamos garota, fique de pé aí em cima! Vamos ver se você não perdeu o
jeito. Pelo que me lembro, você pulava bem longe! – nem precisei olhar, era
voz do meu pai. Ele sempre gostou de me balançar, bem, bem alto. Mesmo
que isso deixasse a mamãe louca de preocupação.
- Pai, acho que já fiquei velha para essas coisas... – Foi o que eu disse, mas
já tentava me manter equilibrada de pé no assento que subia e descia.
- Ixiiiii papai!!!! Aposto que ela vai cair como um jaca! – era o pentelho do
meu irmão caçula gritando do escorregador.
- Pois é, se fosse você não faria isso, nunca vai conseguir bater meu
recorde!! – Foi a irmã do meio, que tinha acabado de pular do balanço ao lado
e estava marcando a uma linha onde tinha pousado.
É claro que eu conseguiria pular mais longe que aquilo!
- Então querida? Aceita o desafio? – era papai, ainda me empurrando mais e
mais alto.
Antes que pudesse responder escutei minha mãe:
- Querido! O que está fazendo?! Amy, dessa daí, isso é um perigo! – ela
vinha correndo com as sobrancelhas franzidas.
- Você ouviu sua mãe Amy! Dessa daí! – papai disse, posso ter certeza, com
um sorriso travesso nos rosto.
E os meus irmãos riam e gritavam para mim pular, e eu ria também.
- Não, não foi isso que eu quis... ah! Desisto! – e mamãe parou com as mãos
na cintura contendo o riso.
- Ok, já está alto o suficiente. Pronta? – E então meu pai foi se juntar ao
resto da família no suposto lugar onde eu deveria parar.
Todos estavam sorrindo para mim. E lá em cima, com o sol aquecendo meu
rosto, eu me sentia em paz.
Então eu pulei.
E toda aquela paz se foi, pois enquanto caía um desespero me invadiu. E
várias perguntas cruzaram minha mente naqueles segundos.
Por que eu pulei?
Por que eu me machuquei?
Por que começou a chover?
Por que todos vocês foram me levar para o hospital? Por que não chamar
uma ambulância?
Por que não deixaram os mais novos com alguém?
Por que não deixaram para o dia seguinte?
Por que raios a estrada tinha que estar uma merda e por que estava
chovendo como se não houvesse amanhã?
E por que, eu me pergunto, por que vocês me deixaram aqui?
Eu não quero se abandonada.
Ei, pai, quem vai me empurrar agora?
Meus pés encostam o chão, e estou sentada no balanço, que finalmente
parou. Sem o barulho das correntes, o silêncio parece inquebrável.



domingo, 11 de março de 2012

Árvores


O sol está se pondo. E fico admirada em como os últimos raios do dia ficam
perfeitos entre as folhas das árvores. Fingindo não ter mais o que fazer,
sento-me na grama e me concentro na imagem a minha frente.
É como se o sol tentasse absorver à árvore, tentando levá-la com ele. Mas
esta é resistente demais. Presa fortemente a chão, incapaz de se deixar
levar pelo calor. Deve ser ainda mais magnífica a noite.
De repente, tudo fica escuro, ou nem tanto. Porque ainda vejo luz nos
espaços entre os dedos que cobrem meus olhos.
- O que você quer Tom? – Sempre sei quando é ele, sempre.
- Como sabia que era eu? – Dizendo isso ele tirou as mãos do meu rosto e
ficou em pé na minha frente.
O mesmo jeans e tênis desbotado com a sua melhor camisa com manchada
de alguma substância desconhecida. O mesmo rosto travesso daquele menino
de 10 anos, com seus olhos negros astutos e cabelos desgrenhados de
mesma cor. Alguns diriam que ele é desleixado. Bom, não pra mim.
- OOOOLÁÁÁÁÁ???? Kim? Ainda está entre nós? – e lá estava eu vagando
de novo, mas ele me acordou com um peteleco na testa.
- Ai! Isso dói!
- É, mas trouxe você de volta. Não sei como consegue se perder tão fácil na
sua própria cabeça.
- Há-há. O que quer?
- Nada. Só queria achar você.
- Ok. Missão cumprida. E agora?
Ele olhou ao redor e então pegou meu pulso e me fez levantar me puxando
até o tronco de uma das árvores.
- Acho que foi nessa aqui... Aha!
Eu sabia o que ele tinha achado mesmo sem olhar.
Em um pedaço do tronco grosso, quase ilegível:
Tom X Kim
- Você lembra-se do dia que a gente fez isso? Faz uns... 6 anos né? Dissemos
que seriamos parceiros, sempre ajudando um ao outro e você disse que
nunca na vida ia encontrar um parceiro melhor do que este que vos fala!
- Não me lembro dessa última parte...
- Pois então você tem problemas de memória, querida.
- Ou você tem problemas com sua imaginação... – e então empurrei seu
ombro de leve, e ele repetiu o gesto.
Ficamos em silêncio por um tempo até que eu encostei meus dedos nas
palavras gravadas na árvore. Perdida nas minhas lembranças daquele dia,
quando eu era uma menininha de 10 anos. Tentando imaginar quando foi que,
durante esses seis anos, as coisas mudaram.
- Kim, nós ainda somos parceiros, não somos?- ao dizer isso ele parecia
tentar convencer a si mesmo.
- Claro que somos. – disse tentando parecer firme.
- Então você não mentiria pra mim, não é?
- Jamais, parceiro.
Então ele olhou pra cima e disse:
- Então, você é afim do meu irmão?
Ao ouvir isso, dei um passo pra trás e me engasguei, sabe-se-lá com o que.
- Por que isso agora?
- Fiquei curioso, só isso.
Ainda um pouco chocada com a pergunta, tento pensar no senti pelo mais
velho dos dois irmão Lasiter há muito tempo. A lembrança me faz sorrir e
percebo que não há problema nenhum em dizer a verdade.
- Se quer mesmo saber, sim eu já tive uma quedinha pelo mais velho dos
Lasiter. Mas eu tinha 10 anos, passou.
- Ah, que bom!
E de repente ele ficou imóvel, como se tivesse feito algo que não devia.
Interessante.
- Por que isso é bom?
Então ele começa a coçar a cabeça e olhar inquieto para os lados, como se
procurasse uma saída.
Eu, fiquei encarando-o quieta. E por me conhecer muito bem, ele sabia que a
única opção era a verdade.
- É que... Ah...que eu soube que tem um cara por ai que está de quatro por
você. – dito isso ele olhou pra mim, com um meio sorriso sem graça no rosto.
Fui obrigada a sorrir. Ambos sabíamos que não importa o que ele dissesse, já
era tarde. Está tudo escrito no rosto dele. Em letras grandes e vermelhas.
Ele nunca foi bom em esconder as emoções como eu.
Saindo do meu devaneio, vejo que ele está olhando para o chão chutando a
grama.
Então eu virei às costas e fui andando, pude ouvir ele tentar dizer alguma
coisa, mas resolvi me adiantar. Parei, porém não ousei olhar para trás.
Respirei fundo e disse:
- Ei parceiro! Diga pra esse cara que ele está sem sorte, porque no final das
contas eu ainda estou apaixonada por um Lasiter.
E sai correndo para o meio das árvores.