segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Presente


Nós estamos parados, perto da sorveteria. E eu não acredito no que ele
disse, e apesar de estar feliz, tento parecer brava.
- Eu pensei que tinha dito que não queria nada.
- É você disse mesmo, mas eu não estou nem aí. Eu quero te dar um presente.
Ele está com as mãos nos bolsos da calça e usando aquele All Stars que eu
dei a ele séculos atrás. Já está gasto e desbotado e eu já mandei jogar fora,
mas ele se recusa.
Isso meio que me deixa feliz.
- Então, já escolheu?
Eu suspiro, fecho os olhos e depois abro um e olho pra ele.
- Você não vai desistir vai?
- Não. – e então ele dá um sorriso torto. O sorriso que eu conheço e amo a
tanto tempo.
Depois dessa afirmação, começamos a andar e conversar sobre coisas
aleatórias, rindo e caçoando secretamente das pessoas que passavam. E,
admito, não estava prestando nenhuma atenção nas vitrines, tinha esquecido
completamente o propósito daquela caminhada. Por isso ele me pegou de
surpresa quando perguntou:
- E então, viu alguma coisa interessante?
- Ah... Eu... – Droga! Nem me lembro em que lojas nós passamos! Pense! –
Hem, por que não comprou o meu presente você mesmo como sempre? Seus
presentes são sempre ótimos!
Agora foi a vez dele de gaguejar. Foi uma série de “ahs”, “bons” e “É que”
até que ele virou de costas pra mim e sussurrou alguma coisa.
- O que disse? – e eu me desloquei pra frente dele de novo.
Ele estava um pouco vermelho e começou a coçar a cabeça e olhar pra todos
os lados, menos pra mim. Aquilo era um tanto fofo.
- Responda a pergunta! – e eu segurei a rosto dele com as mãos o fazendoele
olhar pra mim. E sorri.
Isso pareceu acalmá-lo. Então ele ergueu as mãos pro alto e depois os
colocou atrás da cabeça e olhou pra cima.
- Tá legal, você me pegou! Eu só queria uma desculpa pra poder sair com
você sem que parecesse... Sabe, pra que não ficasse nervoso e suando como
porco e não falando nada direito e...
- E ficar do jeito que está agora?
- É, acho que meu plano não deu muito certo. E eu acabei de estragar tudo
não foi? Quer dizer, não dá mais pra fingir que é só amizade agora.
Se ele não estivesse tão envergonhado e olhasse pra mim, veria que eu
estou mordendo o lábio e tentando não chorar. Então viro as costas pra ele,
não consigo olhar pra ele ainda.
- Sabe, eu vi uma coisa que eu gostei de verdade, lá perto da sorveteria.
Posso sentir ele finalmente olhando pra mim e depois de um tempo, ele
finalmente diz:
- Ótimo, vamos lá então.
Ando o caminho todo um pouco a frente dele, nós dois em silêncio.
Quando chegamos no lugar exato onde começamos eu paro e espero ele
ficar ao meu lado. Olho de esguelha pra ele, mas ele está olhando pra frente,
então diz, tentando parecer alegre:
- E então onde está a coisa que você gostou?
- Olha, se tivesse se dado ao trabalho de olhar pra droga da minha cara
certamente já saberia o que é! Porque o caminho todo de volta pra cá eu não
consegui tirar esse sorriso idiota da minha cara, estúpido! – então ele se
virou pra mim com uma cara muito estranha, como se não acreditasse – Aqui,
é isso que eu quero.
E eu segurei a mão dele.

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